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Audiências trabalhistas telepresenciais e o acesso à justiça no Maranhão

  • Foto do escritor: Tâmara Matias
    Tâmara Matias
  • 11 de mai. de 2020
  • 5 min de leitura

Atualizado: 12 de mai. de 2020


Alfredo Goes

Tâmara Matias

Em tempos de recomendação de isolamento social e até mesmo decretos para “lockdown”, é uma preocupação de vários Tribunais Regionais do Trabalho a preservação do acesso à justiça e da razoável duração do processo, que são direitos fundamentais de cada parte que procura a Justiça do Trabalho para solucionar seus litígios. A solução encontrada foi a realização de audiências telepresenciais, já que os demais atos do processo, como as sentenças, continuaram a ocorrer a partir do trabalho remoto dos magistrados e servidores.


As alterações na forma de realização de tais atos processuais justificam-se, dentre outros motivos, pela incerteza acerca da duração das medidas de isolamento social implantadas a fim de conter a propagação do novo coronavírus, bem como em razão da natureza essencial e ininterrupta da atividade jurisdicional. Cabe-nos destacar, ainda, que a novidade resulta da aplicação do art. 236, §3º do Código de Processo Civil, que possibilita a prática de atos processuais por meio de videoconferência, além de autorizações concedidas por diversos atos/resoluções editados recentemente, no âmbito do Poder Judiciário.


Nesse sentido, definiu o Tribunal Regional do Trabalho da 16ª Região (Maranhão), por meio do Ato Conjunto GP e GVP/CR nº 005, de 30 de abril de 2020, que as audiências serão realizadas de forma virtual ou telepresencial, nas Varas do Trabalho e nos Centros Judiciários de Métodos Consensuais de Solução de Disputas (CEJUSCs), sessões de julgamento virtuais e telepresenciais pelo Pleno e pelas Turmas do Tribunal. Tudo isso em cumprimento ao direito fundamental ao acesso à justiça. Mas será que as audiências telepresenciais afastam ou aproximam as partes do chamado acesso à justiça? É o que veremos a seguir, porém antes explicaremos pontos fundamentais do Ato Conjunto aqui tratado.

Ordem de realização das audiências telepresenciais


Nos termos do art. 4º do Ato Conjunto nº 005/2020, as audiências a serem realizadas nas unidades judiciárias ou nos CEJUSCs-JT, por meio virtual ou telepresencial (videoconferência), conforme cronograma estabelecido no Ato GP e GVP/CR nº 004/2020, de 29.04.2020, serão realizadas de forma gradual, sempre por meio do aplicativo “Google Meet/Google Hangout Meet”, de acordo com a ordem estabelecida no aludido artigo, a saber:


1. audiências iniciais de casos envolvendo tutelas de urgência e com cadastro do assunto COVID-19 e audiências de conciliação e de mediação, que poderão ser realizadas a partir de 4 de maio de 2020;

2. audiências iniciais em processos de tramitação preferencial (na forma da lei), a partir do dia 11 de maio de 2020;

3. audiências iniciais nos demais processos, que poderão ser realizadas a partir de 18.05.2020; e

4. audiências unas e de instrução, apenas a partir de 25 de maio de 2020.


Segundo o art. 4º, V, do mencionado Ato Conjunto, serão realizadas, preferencialmente, aquelas audiências que não necessitem de colheita de prova oral, em qualquer caso, sendo garantidas a segurança e a transparência na produção da prova, sem, contudo, adentrar no mérito do que seria segurança e transparência na produção da prova. Caberá ao juiz do trabalho adotar as medidas que julgar necessárias para que as audiências telepresenciais não causem às partes insegurança ou desconfiança quanto à higidez do ato.

Audiências de Instrução serão realizadas, nessas circunstâncias, sempre pelo Google Meet: temos um problema?


Com relação às audiências unas e de instrução, há a recomendação que sejam aproveitadas as datas já designadas para tais audiências, e estas serão convertidas, se for o caso, em iniciais ou de conciliação.


Além disso, é de exclusiva responsabilidade dos advogados e membros do Ministério Público a manutenção de conexão estável com a internet, instalação e utilização do aplicativo, conforme o §1º do art. 5º, do aludido Ato Conjunto nº 005/2020.


Destaca-se ainda que, segundo o mesmo diploma, as partes, testemunhas, auxiliares e assistentes do Juízo que tenham que participar das audiências, também devem fazê-lo por meio da plataforma Google Hangouts Meet.


Nesse ponto, sem dúvida, tem-se um problema: é possível responsabilizar os representantes, as partes e as testemunhas por uma conexão estável com a internet? Entendemos que sim, mas é necessário algum aprofundamento no “modus operandi”.


Vamos traçar rápido paralelo: qualquer audiência, mesmo presencial, imputa às partes algum ônus: custos com locomoção, por exemplo. Por outro lado, o Judiciário deve ter a estrutura necessária para receber as partes. Quanto às audiências telepresenciais, imagina-se que o Poder Judiciário deve cumprir com seu dever de fornecer plataforma acessível a todos, sob pena de direta violação ao princípio do acesso à justiça. As partes, por meio de seus procuradores, devem informar qualquer impossibilidade para a realização do ato, inclusive a impossibilidade de acesso por conexão estável.


Acesso à justiça como limite dos limites


Como já mencionado, a manutenção da atividade jurisdicional por meios telemáticos modernos que, ao que se conclui, possibilitam a realização de atos processuais indispensáveis à garantia da razoável duração do processo e da celeridade de sua tramitação, atende aos mandamentos constitucionais e, sem dúvidas, representa verdadeiro avanço para o Poder Judiciário, especialmente, no âmbito da Justiça do Trabalho.


Contudo, deve-se atentar que os direitos fundamentais aqui mencionados e pertinentes a esta temática, tais como o acesso à justiça (art.5º, XXV, CF) e duração razoável do processo e celeridade na tramitação (art. 5º, LXXVIII, CF) necessitam ser interpretados como basilares do ordenamento jurídico e, do mesmo modo, como “limite dos limites” (Schranken-Schranken)[i].

Os direitos fundamentais, exemplificados aqui pelo direito ao acesso à justiça, não são absolutos. Ao contrário, podem sofrer limitações ou restrições a depender das condições do caso concreto. Assim, pode-se admitir que em situações excepcionais, como a que nos é imposta atualmente, certas restrições ao acesso à justiça, com imposição de determinadas condições à prestação jurisdicional, sejam possíveis.


Isso porque estas medidas de restrição aos direitos fundamentais, segundo o princípio da proteção do núcleo essencial, que entende os direitos fundamentais como “limites dos limites” devem ser, por óbvio, também restritas. Sendo assim, é necessário haver “clareza, determinação, generalidade e proporcionalidade” nas limitações eventualmente impostas aos direitos fundamentais.[ii]


As mudanças realizadas na forma de execução das audiências trabalhistas certamente encontrarão obstáculos, seja na ausência de prática com as novas ferramentas pelas partes envolvidas, seja pela total impossibilidade de alguns jurisdicionados utilizarem os meios telemáticos, inclusive por falta de acesso à internet de boa qualidade ou por total falta de acesso à internet, dentre outros fatores.


Ademais, menciona-se o fato de que diante da completa inaptidão para o uso das ferramentas, advogados, partes e testemunhas provavelmente se reunirão nos escritórios de advocacia e/ou buscarão atendimento presencial junto aos órgãos públicos, a fim de solucionar tais problemas de ordem técnica, o que representaria verdadeira falha na busca pelo objetivo central das novidades: possibilitar o distanciamento social, preservando as atividades jurisdicionais.


Conclui-se, portanto, que a despeito das vantagens instituídas pelo Ato Conjunto nº 005/2020, faz-se necessária a preservação do núcleo essencial dos direitos fundamentais pertinentes, por servirem também como “limites dos limites”, como anteriormente mencionado. Ao nosso entender, a aplicabilidade de tal diploma deve seguir os ditames da razoabilidade e proporcionalidade. Desse modo, é oportuna a inclusão de possibilidade de ser apontada, por qualquer um dos que devam se fazer presentes ao ato, a absoluta impossibilidade técnica ou prática para o ato processual em comento por meio eletrônico, com a devida justificativa, como inclusive já previsto nos termos do §2º, do art. 3º da Resolução nº 314/2020 do CNJ, bem como art. 5º, caput, Ato nº 11/GCGJT/ 2020 do TST.

[i] MENDES, G. F.; BRANCO, P. G. G. Curso de Direito Constitucional. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2018, p. 221. No mesmo sentido: SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de Direito Constitucional. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 131. [ii] MENDES, G. F.; BRANCO, P. G. G. Curso de Direito Constitucional. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2018, p. 222.

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