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O caso Uber: como identificar uma relação de emprego

  • Foto do escritor: Bianca Ribeiro
    Bianca Ribeiro
  • 5 de fev. de 2019
  • 6 min de leitura

O Tribunal Superior do Trabalho publicou em 31/01/2019 uma decisão proferida em processo judicial em que o motorista de Uber requeria reconhecimento do vínculo de emprego com a plataforma Uber. Mas quais os requisitos da relação de emprego? Como identificar a situação de empregado regido pela Consolidação das Leis do Trabalho?


Primeiramente, deve-se saber que a Consolidação das Leis do Trabalho - CLT é uma Lei que estatui as normas que regulam as relações individuais e coletivas de trabalho e, em seu artigo 2º, define que empregador é a “empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação de serviços”. E considera-se empregado, de acordo com o artigo 3º da CLT, “toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário”.


A CLT regula a relação entre empregado e empregador e existem 5 (cinco) requisitos para que um trabalhador urbano ou rural seja considerado empregado e parte de uma relação de emprego, são eles: pessoalidade; subordinação; onerosidade; natureza não eventual e o empregado não corre o risco do investimento.


A “atividade profissional” de “motorista de Uber” trata-se de um novo modelo de produção e de trabalho, resultado da evolução da sociedade e das necessidades econômicas e sociais do mundo moderno, que faz surgir novas relações de trabalho com características próprias que passaram a ser analisadas sob a ótica jurídica, com debates acalorados sobre sua regularização e natureza jurídica.


Ao julgar o caso concreto e com base nas provas produzidas nos autos, a 8º Turma do Tribunal Superior do Trabalho - TST ao julgar o recurso de Agravo de Instrumento em Recurso de Revista do PROCESSO Nº TST-AIRR-11199-47.2017.5.03.0185, interposto por um motorista de Uber que alega que ficaram comprovados todos os requisitos dos art. 2º e 3º, da CLT, passou-se a analisar a presença de tais requisitos na relação entre o motorista e a empresa Uber (dona do aplicativo).


O requisito da pessoalidade significa dizer que o indivíduo foi escolhido por suas características (qualificação técnica, experiência, qualidades etc), de forma que o empregado não pode ser substituído por outro de sua escolha, pois foi contratado para prestar pessoalmente os serviços, ou seja, o contrato é firmado com pessoa certa e determinada.


No caso Uber em análise, a nobre relatora, Ministra Dora Maria da Costa, ressaltou que “O que importa é que apenas prestadores previamente habilitados e autorizados pela Uber podem oferecer os serviços pelo aplicativo”. Houve a desconsideração das alegações da empresa (Uber) no sentido de que vários motoristas podem dirigir o mesmo veículo, e o TST entendeu presente a pessoalidade.


Para verificar a presença do segundo requisito, habitualidade, costuma-se perguntar: O empregado trabalha todos os dias, uma vez por mês, uma vez a cada seis meses? Com que periodicidade você precisa que o trabalho seja feito?


E para entender este requisito e saber se ele está presente ou não configurando uma relação de emprego deve-se olhar sob a ótica do empregador, logo, deve-se analisar a necessidade daquele tipo de mão de obra.


Se houver a necessidade permanente da mão de obra e do serviço, considera-se presente o requisito da habitualidade, seja de forma continua ou intermitente (aquele trabalho que acontece apenas dois dias da semana, ou somente no final no ano, por exemplo).


Desta forma, se o motorista de Uber exerce essa função de forma contínua nos meses em que estiver vinculado ao aplicativo Uber, é possível concluir pela presença deste requisito.



Toda prestação de trabalho pressupõe uma contraprestação pecuniária. Ou seja, o patrão recebe os serviços, o trabalho, enquanto o empregado recebe o pagamento pelo respectivo serviço. Logo, quem trabalha, trabalha para receber algo em troca.


A remuneração pelo trabalho deve ser preferencialmente pecúnia, ou seja, dinheiro, de acordo com o artigo 82 da CLT. No entanto se o empregado trabalhou e recebeu a contraprestação em roupas, ele recebeu seu salário em utilidade e não deixa de ser uma relação de emprego (trabalho x contraprestação), mesmo que irregular, posto que em desacordo com norma legal.


No Processo em análise sobre o Caso Uber não restam dúvidas que o motorista fazia o transporte de pessoas e recebia uma contrapartida de natureza econômico-financeira. O motorista de Uber pode ser comparado a um comissionista puro que trabalha somente por produção.



Umas das principais características diferenciadoras da relação de emprego é a subordinação que é a dependência do empregado em relação ao empregador, posto que deve se sujeitar as regras e deve obediência as ordens e normas estabelecidas.



Existe subordinação quando presente o poder de direção e comando do empregador sobre o empregado, assim como há interferência direta no “modus operandi” e na quantidade de tempo dedicado ao trabalho.


O grau de subordinação varia bastante de acordo com a posição ocupada pelo empregado na hierarquia da empresa, quanto mais elevado o grau ou quanto mais técnico e intelectual o trabalho desempenhado menor será a subordinação.

Para o Motorista de Uber a 8º Turma do TST concluiu que não recebia ordens da reclamada, empresa dona do aplicativo de mesmo nome - Uber -, não necessitava comparecer a empresa, o início da prestação de serviços ocorreu por um mero cadastro “on line”, não havia quantidade de horas trabalhadas pré estipuladas, assim como não existia previsão de número mínimo de atendimentos, e o motorista não era avaliado pela empresa, logo, não existe a subordinação jurídica.



Também relevante a análise dos riscos da atividade econômica, pois gerir um empreendimento envolve vários fatores que podem fazer o negocio dar certo ou não. Essa situação de incerteza não deve ser do empregado, pois se ele correr qualquer risco decorrente do empreendimento não será considerado empregado.


Se o negócio não der certo, se a empresa falir, os salários do empregado e todas as verbas trabalhistas devidas devem ser quitadas e ainda tem preferência, tendo em vista a natureza alimentar.


A Lei 13.467/2017 trouxe três hipóteses que transferem ao empregado algum risco do empreendimento sem descaracterizar o vinculo empregatícios, quais sejam: Contrato intermitente; teletrabalho; e empregado hipersuficiente.


Para o motorista de Uber é fato notório que é de sua inteira responsabilidade a manutenção do seu próprio veículo, abastecimento, despesas com telefone celular, internet e outros. Logo, o próprio motorista investe no negócio e assume os riscos da atividade como a quantidade de viagens que aceita e o risco de um acidente de trânsito, por exemplo. Sendo assim, esse requisito também não se encontra presente afastando a possibilidade de configurar uma relação de emprego.



Por todo o exposto, podemos dizer que para haver uma relação de emprego devem estar presentes todos os cinco requisitos acima para que o empregado preste serviço de forma pessoal, em atividade necessária para a empresa, com subordinação, mediante recebimento de contraprestação pecuniária e sem correr riscos do negócio.


Segue abaixo a ementa do caso Uber ora em análise:

AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. MOTORISTA DE APLICATIVO. AUTONOMIA NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS. VÍNCULO EMPREGATÍCIO NÃO CONFIGURADO. O Tribunal Regional consignou que os elementos dos autos demonstram autonomia do reclamante na prestação dos serviços, especialmente pela ausência de prova robusta acerca da subordinação jurídica. Ademais, restando incontroverso nos autos que, "pelos serviços prestados aos usuários, o motorista do UBER, como o reclamante aufere 75% do total bruto arrecadado como remuneração, enquanto que a quantia equivalente a 25% era destinada à reclamada (petição inicial - item 27 - id. 47af69d), como pagamento pelo fornecimento do aplicativo", ressaltou o Tribunal Regional que, "pelo critério utilizado na divisão dos valores arrecadados, a situação se aproxima mais de um regime de parceria, mediante o qual o reclamante utilizava a plataforma digital disponibilizada pela reclamada, em troca da destinação de um percentual relevante, calculado sobre a quantia efetivamente auferida com os serviços prestados". Óbice da Súmula nº 126 do TST. Incólumes os artigos 1º, III e IV, da Constituição Federal e 2º, 3º e 6º, parágrafo único, da CLT. Agravo de instrumento conhecido e não provido. (AIRR - 11199-47.2017.5.03.0185 Data de Julgamento: 18/12/2018, Relatora Ministra: Dora Maria da Costa, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 31/01/2019)

Neste caso, a relatora, Ministra Dora Maria da Costa, destacou que “a situação se aproxima mais de um regime de parceria, mediante o qual o reclamante utilizava a plataforma digital disponibilizada pela reclamada, em troca da destinação de um percentual relevante, calculado sobre a quantia efetivamente auferida com os serviços prestados”. Entendendo, portanto, pela não configuração de uma relação de emprego, pois ausente, principalmente os requisitos do risco econômico e subordinação.


Clique aqui para consultar o inteiro teor da decisão comentada.


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1 comentário


alessiomvj
06 de fev. de 2019

Texto claro e elucidativo. As relações de trabalho desafiam o operador do direito a caminhar junto às atualizações legislativas bem como a dinâmica de mercado cada vez mais inovadora.

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